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Os mortais vírus Hendra e Nipah

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Hendra e Nipah são vírus altamente patogênicos da família paramyxoviruses que surgiram recentemente de raposas-voadoras(Morcegos) para causar surtos de doenças graves em seres humanos e animais na Austrália, Malásia, Cingapura e Bangladesh. Sua constituição genética única,sua alta virulência e ampla gama de hospedeiros levaram os cientistas a um novo gênero dentro da família Paramyxoviridae , o Henipavirus e a sua designação como Nível 4 de Biossegurança 




VÍRUS NIPAH E DEPRESSÃO

Fernando Portela Câmara




As doenças mentais e do comportamento são respostas cerebrais a um evento agressor que pode ser de natureza variada (Lishman, 1998). O DSM, p. ex., considera isto ao propor cinco eixos diagnósticos para as doenças mentais, os três primeiros concentrando a maioria dos diagnósticos. O primeiro eixo, sindrômico, nada esclarece sobre a etiologia das doenças mentais, o segundo considera as doenças originárias do desenvolvimento e também nada esclarece sobre suas origens, e o terceiro coloca numa única categoria, “orgânica”, alterações mentais decorrentes de doenças somáticas de causa tóxica ou fisiopatológica.



Certas infecções são também causas de distúrbios mentais, seja por uma ação direta, como nas encefalites atípicas, seja por ação indireta, por ação de mediadores da resposta imune.



Em artigo anterior (Câmara, 2009), mostramos como certas infecções causam alterações neuropsiquiátricas e como isso poderá vir esclarecer ao menos parte das etiologias e, com isso, introduzir tratamentos eficientes na psiquiatria. Veremos neste artigo alguns outros eventos infecciosos importantes e suas relações com transtornos psiquiátricos.



Há uma categoria de vírus algumas vezes chamados de “exóticos” por estarem aparentemente restritos a nichos tropicais, sendo o homem acidentalmente exposto a eles. São vírus zoonóticos que, no mundo atual globalizado, estão ganhando uma importância muito grande, uma vez que são emergentes e podem se espalhar para centros urbanos distantes carregados por hospedeiros virêmicos, humanos ou animais, na complexa rede do tráfego aéreo internacional. A aparição destes vírus traz um rastro de mortes, mas é possível que eles circulem silenciosamente causando distúrbios diferentes daqueles que são vistos quando emergem em eventos zoonóticos.



Interessantemente, os vírus que aqui nos interessam participam da mesma família (Paramyxoviridae) dos vírus causadores do sarampo, da caxumba e da doença respiratória sincicial aguda. Estes vírus emergentes são agora conhecidos como Hendra e Nipah, ambos causando infecções graves em humanos, este último também causa de sintomas psiquiátricos. 



O vírus Hendra tem este nome porque foi isolado em cavalos em Hendra, um subúrbio de Brisbane, Austrália, em 1994. Este vírus, até então desconhecido, tem um alto poder patogênico e letal (50%) para equinos. O cavalo infectado assume um comportamento maníaco e perigoso, e logo em seguida sucumbe numa infecção respiratória grave, semelhante à pneumonia da influenza (Eaton et al, 2006). Nos seres humanos acidentalmente infectados, o quadro é semelhante e freqüentemente fatal (Eaton et al, 2006). O reservatório deste vírus é o morcego frugívoro conhecido na região como “raposa voadora”. A saliva e urina deste animal infectam a relva que é comida pelos cavalos, fechando o ciclo infeccioso. A busca por este vírus no mundo revelou sua provável endemicidade em morcegos na Nova Guiné, Madagascar e Camboja



Em 1998-1999 uma epidemia originária de porcos infectou 265 pessoas com 105 casos fatais em Sundai Nipah, província da Malásia (Chua et al., 1999; Chua et al., 2000). Isolou-se um vírus até então desconhecido, que foi chamado de Nipah (Goh et al., 2000), da mesma família do vírus Hendra. Este vírus também tem um morcego frugívoro como reservatório, que infecta porcos por um mecanismo semelhante ao vírus Hendra (Eaton et al, 2006).



A encefalite humana do vírus Nipah difere dos outros vírus neurotrópicos porque se caracteriza por múltiplas lesões na substância branca do cérebro, e as características destas lesões podem auxiliar no diagnóstico (Lim et al, 2000; Lim et al, 2002). A infecção pelo virus Nipah causa uma depressão importante, clinicamente indistinguível da depressão maior, e embora alterações nos lobos frontal e temporal e ganglia basal, especialmente o núcleo caudado, estejam fortemente correlacionadas à depressão (Cheyette e Cummings, 1995), no caso do Nipah as lesões multifocais na substancia branca e, em menor extensão, nas estruturas profundas, pode direcionar o diagnóstico de uma depressão com uma etiologia infecciosa específica..



Um estudo de 13 casos humanos em Singapura permitiu estudar controladamente a clínica desta virose, bem como seus cérebros por RNM (Beng-Yeong et al, 2004). Mais da metade dos casos apresentou depressão importante, tanto cognitiva quanto emocionalmente (desesperança, sentimento de desvalia, pensamentos suicidas, etc). A depressão aparecia logo ao deixar o hospital ou cerca de um ano após a infecção. Déficit de memória, especialmente da memória verbal estava presente, e alguns ficaram incapacitados neurológica e mnemicamente para o trabalho. Outras sequelas observadas foram a síndrome da fadiga crônica e alterações de personalidade.



Em nenhum caso se observou sintomas obsessivo-compulsivos ou psicóticos. A depressão causada pelo vírus Nipah era indistinguível da forma idiopática, tanto clinicamente, quanto pelos escores nos testes diagnósticos. Melancolia, anedonia, astenia, perda de peso, agitação ou retardo psicomotor, sentimentos de desesperança ou desvalia, dificuldade de concentração e pensamentos de morte ou suicídio, torna o doença pelo vírus Nipah indistinguível da depressão (Beng-Yeong et al, 2004). 


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